Cuidados com um grupo

 

Nesse post iremos compartilhar alguns dos elementos que se mostraram muito presentes ou necessários durante o último bloco do Treinamento Matrix-Hakomi Brasil. Foi um módulo extremamente delicado, bonito e que nos mostrou ainda mais o amadurecimento do grupo. Esses elementos que serão citados, fazem parte do cultivo de uma cultura de bem estar, seguem princípios e habilidades que construímos ao longo do treinamento.

Cuidar do tempo

 

                                                                                                                     

Cuidar do tempo onde aparentemente há uma cultura que desafia os ponteiros do relógio pode ser uma tarefa desafiadora e talvez até um pouco desconfortável. Ao longo do treinamento, entretanto, aprendemos o quão importante isto é!

O tempo dá contorno aos exercícios, aos intervalos e ao próprio processo de aprendizagem no que diz respeito ao conteúdo, por exemplo. Já quando estamos na função de facilitadores ou membros de um grupo, estar atento ao tempo torna-se essencial pois busca garantir que o planejado ocorra e que o grupo tenha a possibilidade de realizar o que foi proposto. É também a gestão do tempo que ajuda a garantir o espaço de fala de todos e a atenção a nossa escuta – a de nós mesmos e a do outro. Tempo que dá segurança para viver as experiências e seus processos.

Seguir a organicidade

 

Um dos princípios do Hakomi que são incorporados no MatrixWorks é o da organicidade.

Em MatrixWorks, consideramos o grupo como um sistema vivo e

Cada sistema vivo tem sua própria organização e caminho para o crescimento, cura e evolução. Quando todas as partes estão se comunicando dentro do todo, o sistema é autodirigido e se autocorrige; tem uma sabedoria interior ou mente próprias. 

Temos muitos exemplos práticos de como esse princípio se manifesta seja ao longo do treinamento, seja no nosso dia a dia, no ambiente de trabalho ou em casa. Durante os dias de cada módulo,  recebemos uma série de estímulos que fazem parte do nosso processo de aprendizagem:  Ouvimos, discutimos, experimentamos, assistimos demonstrações, etc. Há um processo que demanda atenção, energia e, naturalmente , nosso corpo vai experenciando e gerenciando toda essa gama de informações. Podemos repousar de modo mais relaxado na cadeira, buscamos um café, saímos para tomar ar, usamos o telefone para satisfazer uma necessidade de distração ou para cuidar de alguma preocupação, enfim. Sendo que em alguns momentos o grupo como um todo demonstra sinais semelhantes. Às vezes também rimos juntos, trocamos olhares de cumplicidade ou de ternura. O tempo todo o grupo está tentando gerenciar e dar conta da experiência. Seguir a organicidade do grupo, permite realizar ações ou fazer ajustes que sejam condizentes e necessários para que tudo possa seguir um fluxo de bem estar.

Rastrear o campo

 

 

Uma das habilidades que desenvolvemos ao longo da formação é o Rastreamento.

Rastreamento é a habilidade de seguir o fluxo das experiências presentes do outro. É a visão constante e escuta, a fim de acompanhar o que está acontecendo ao outro. Exige uma capacidade de sair para além de si mesmo e de forma contínua ficar com o que a outra pessoa está sentindo e fazendo. É a leitura constante de sinais, como no rastreamento de um animal pela floresta.¹

No caso de trabalhos coletivos, esse “outro” é o próprio grupo.

Quando estamos em interação, seja desenvolvendo algum trabalho, cumprindo alguma tarefa ou até mesmo conversando, existe uma infinidade de informações que estão sendo expressas a cada momento. Rastrear é uma possibilidade de prestar atenção e coletar essas informações, que podem ser usadas para tomar decisões, fazer uma pausa ou planejar alguma intervenção que seja necessária no momento.

Por exemplo, durante o treinamento vemos essa habilidade ser usada quando as professoras ao perceberem alguns sinais que podem ser demonstrações de cansaço, checam conosco essa impressão, em seguida validam nossa sensação e, carinhosamente, nos informam sobre o conteúdo que vem a seguir e os próximos passos do dia. O rastreamento também pode ser útil quando algo muito mobilizador acontece e precisamos de uma pausa ou um reajuste do dia, de forma que possamos ter tempo para “digerir” as emoções e informações.

Quando não estamos atentos à esses sinais e quando não rastreamos, podemos agir de forma descuidada, um pouco “forçando a barra” em determinadas ações. Por exemplo, às vezes o grupo ainda está muito ativado devido a alguma atividade realizada e, enquanto facilitadores ou líderes,  não construímos uma dinâmica que possa dar um contorno ou propiciar um acolhimento e reequilíbrio daquela energia, o que pode fazer com que as pessoas saiam com uma sensação de não-completude.

Enfim, rastrear nos permite seguir a organicidade que se manisfesta naturalmente seja no grupo ou no indivíduo.

Fala suscinta e escuta profunda

 

Todos nós já experimentamos estar em grupo e sentir frustração quando a fala fica monopolizada em uma ou duas pessoas, enquanto os outros se calam mesmo tendo algo importante para dizer. Então o desafio é gerenciar para que isso não aconteça.  Além disso, pode ser um despertar para o desenvolvimento de uma escuta diferenciada e uma atenção à nossa fala.

Grupos grandes ou pequenos quando experimentam um bom nível de conexão, têm a possibilidade de que o momento de compartilhamento seja tomado por uma necessidade grande de falar. Entretanto, nem sempre esse espaço é viável.

Equilibrar a fala com a escuta é estar atento e cuidar de uma parte essencial: Que todos (que assim desejarem) possam se expressar. É muito comum presenciarmos situações onde tenhamos que nos apresentar mas que, o tempo vai passando e as pessoas que ficam no final tenham pouco ou menos tempo para isso.  O próprio grupo pode se autorregular, é verdade, porém, esse acordo é uma atitude que demonstra uma preocupação de que todos possam ter espaço para compartilhar, com qualidade.

Nesse sentido, esse acordo pode ser um recurso a ser utilizado.

Há entretanto, alguns cuidados que devem ser tomados ao usarmos desse acordo. Um deles é que este não seja tomado como uma restrição. Outra possibilidade é que há que se avaliar a necessidade real dele. Podem haver determinados grupos em que a questão a ser trabalhada seja justamente poder falar e ser ouvido. Nesse  sentido, é importante ter a sensibilidade de perceber ou até mesmo antes, durante a fase de planejamento, considerar essa possibilidade e outros meios de cuidar disso.

Bom, essas foram algumas reflexões e ensinamentos que vêm surgindo ao longo do Treinamento. O que acharam dos temas? Quem lembrar de algum momento em que também pensou sobre isso, compartilhe conosco!

Texto e revisão: Adrianne Ogêda e Tulane Paixão.


¹ The Hakomi Method – Ron Kurtz – p. 75